Análise Arkade: fantasmas, rádios e realidades paralelas esperam por você em Oxenfree

28 de janeiro de 2016

Análise Arkade: fantasmas, rádios e realidades paralelas esperam por você em Oxenfree

Em Oxenfree, você é convidado para uma “festa” na praia em uma ilha abandonada. Mas tome cuidado, pois cada canto desta ilha — das florestas às cavernas, esconde segredos. Será que você consegue descobrir o passado tenebroso da ilha e salvar os seus amigos antes do sol raiar?

Oxenfree é o primeiro game do recém-nascido Night School Studiouma desenvolvedora composta por ex-membros da Telltale Games e da Disney. O resultado dessa combinação é um game que mistura aventura com horror e comédia no estilo dos filmes de adolescentes lidando com o sobrenatural como Os Goonies A Hora do Espanto. Ligue a lanterna do seu smartphone e mergulhe na escuridão de Oxenfree!

Uma ilha, uma festa

A história de Oxenfree parece ter saído diretamente de uma fábrica dos anos 80o jogador controla Alex, uma adolescente no colegial que é convidada para uma festa anual em uma praia em Edward’s Island. A ilha já foi uma base militar durante os anos 40, e agora ela é um ponto turístico que se esvazia quando o sol se põe.

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Junto com Ren (o nerd do grupo) e seu novo meio-irmão Jonas, você chega na ilha para passar horas de fogueira, bebida, conversa e calmaria. Só que ao invés disso você logo descobre que há outras duas convidadas: a tímida Nona e a malvada Clarissa. E assim, depois de um jogo de “verdade ou desafio” que dá meio errado, Alex acidentalmente desperta uma espécie de entidade maligna que vive na ilha e coisas pra lá de estranhas começam a acontecer.

Dali em diante, Alex tem que lidar com alguns problemas “normais” — como Jonas tentando conhecer mais de sua nova meia-irmã e Ren querendo de todas as maneiras se aproximar de Nona — enquanto lida com mistérios sobrenaturais que envolvem fantasmas e realidades paralelas… Tudo isso equipada somente com um rádio, pois na ilha não há sinal de telefone… e o próximo navio só vai chegar pela manhã. Boa sorte.

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A grande arma de Oxenfree é sua narrativa. Mecanicamente, o game é similar à outros adventures modernos — como os da Telltale Games, com sua ênfase em diálogos, escolhas e caminhos divergentes que a história pode tomar. Só que, diferente das dezenas de games lançados pela Telltale que seguem as mesmas mecânicas, Oxenfree parece uma verdadeira evolução do gênero dos adventure games.

Similar aos clássicos da LucasArts, há alguns puzzles, e você vai passar grande parte do tempo caminhando pela ilha a procura de certos objetivos. Todo silêncio é preenchido por diálogos, e suas opções são mostradas de um jeito bem bacana: balões de fala aparecem em cima da cabeça Alex, e você pode escolher uma de três opções (ou o silêncio). Mas seja rápido, pois os balões começam a desaparecer se você pensar demais!

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O sistema pode parecer simplório, mas transforma os diálogos em algo orgânico e natural. Por exemplo, se você fizer sua escolha enquanto um outro personagem está falando, Alex geralmente irá interrompê-lo imediatamente. Não há o silêncio sem emoção do sistema (já meio antiquado) da Telltale, os personagens usam cada segundo disponível a eles para desenvolver suas personalidades e expandir os relacionamentos dentro do game.

Uma pergunta, uma resposta

Toda essa naturalidade é extremamente importante para Oxenfree, já que os seus personagens são adolescentes que cresceram no século XXI. Sim, há uma ameaça fantasma (sem trocadilhos com Star Wars), só que ela acaba servindo apenas para trazer a tona os conflitos, romances e dilemas tão comuns em uma história que retrata personagens que estão em busca da maturidade.

Essa é a grande sacada de Oxenfree: o modo como o game facilmente simula o ambiente e as mecânicas de filmes que embalaram a Sessão da Tarde, amedrontando e encantando jovens no período mais complicado da adolescência. O game pode não ter uma grande mensagem por trás de tudo, mas ele tem personagens extremamente carismáticos e bem desenvolvidos que são obrigados a embarcar em um conto de horror que não se apega a clichês nem estereótipos.

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A complexidade dos personagens ajuda não só na hora de contar a história como também na hora de tomarmos uma decisão. Diferente dos games da Telltale — com suas mensagens dizendo que “personagem X vai lembrar disso” –, tudo que Oxenfree exibe é um balão com o rosto de Alex em cima dos outros personagens após certos diálogos, indicando que a opinião deles sobre você mudou. Se ela mudou para melhor ou para o pior, você terá que descobrir conforme os papos avançam.

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Aliás, se o mundo for justo, Alex logo entrará na lista de melhores personagens dos games. No começo de Oxenfree, o jogador pode escolher algumas falas que dizem coisas importantes sobre quem é a Alex. Será que ela gosta de ser sarcástica? Ou será que ela é uma fã de festas? Ela gosta de fumar ou de beber? Ela não vai com a cara da Clarissa? Ela gosta de seu meio-irmão Jonas? Você é quem decide essas coisas.

Alex consegue representar ao mesmo tempo o jogador e a si mesma. Ela não é uma personagem cujas escolhas iriam contra as do jogador, e ela não é um pedaço de papelão sem personalidade. Ela é Alex, um dos melhores pontos de Oxenfree, e que é parte de uma onda de excelentes personagens — junto com a Max, de Life os Strange — que mostra o quão diversificados os games podem realmente ser.

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Todos os elogios dados a Alex também podem ser dados aos outros personagens de Oxenfree. Você desembarca na ilha atrás de uma festa, embarca em uma história assustadora, mas está o tempo ligado principalmente nos dramas e relacionamentos do eclético e divertido elenco do game.

Uma caverna, um rádio

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O terror de Oxenfree não é do tipo “jump scare”, com monstros medonhos pulando na direção da câmera. O game trabalha o horror por meio da atmosfera, e isso funciona graças ao lindo e estiloso visual do game: o cenário é feito em 2D, composto por um estilo que mistura desenho e aquarela, enquanto os personagens são feitos em 3D para dar perspectiva ao mundo do game. Eles quase sempre são vistos de longe, e quando o jogador acessa as fotos tiradas durante o game, os personagens são desenhados em 2D.

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Esse visual diferenciado faz grande parte do trabalho para construir a atmosfera de Oxenfree, desenvolvendo um clima tenso que apenas cresce durante a progressão da história. Os fantasmas são representados por efeitos em 3D similares ao de fitas VHS com defeito, com distorções, interferências e chuviscos que conseguem soar bem bizarros.

Saca só uma palhinha de um desses encontros sobrenaturais:

Essa mistura de 2D 3D (que pode causar alguns problemas com perspectiva, mas nada que afete a experiência) é acentuada por uma câmera cinematográfica. Em vez de roubar o controle do jogador e se tornar um filme interativo, Oxenfree preza ângulos e enquadramentos sutis. A câmera inclinada passa um sentimento de perda de controle. Um enquadramento deixa os personagens pequenos quando comparados à floresta gigante e tenebrosa.

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O som também contribui pacas para a construção da atmosfera. Já que muito do game é composto de diálogos entre personagens longe da câmera, o áudio se torna essencial para explicitar as emoções por trás de cada fala. Todos os membros do elenco estão impecáveis em seus papeis, com ênfase para Gavin Hammon, voz de Jonas e Britanni Johnsonatriz por trás de Nona (que acabou se tornando minha personagem favorita) e, claro, Erin Yvette, que empresta a voz para Alex.

Cada ambiente vem acompanhado dos sons esperados (o vento passando por uma cidade vazia, a água pingando em uma caverna gigante) e uma grande surpresa vem na forma do rádio de pilha que Alex leva para a ilha. A qualquer momento, o jogador pode ligar o rádio e, navegando pelo dial, pode ouvir transmissões misteriosas que variam de gravações ao contrário até bipes de código morse ou músicas que parecem saídas de um desenho do Pernalonga. Tudo isso só aumenta o clima de mistério de Edward’s Island.

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A trilha sonora do game (composta por Scientific American, que também trabalhou em Galak-Z) contém composições marcantes que misturam variados gêneros, desde o rock independente ao eletrônico, com cada gênero representando os dois lados da batalha retratada por Oxenfree. Uma recomendação pessoal é a faixa Beacon Beach, que deixa bem claro logo no início do game que há algo estranho por trás da ilha.

Uma ressalva importante é que não há legendas nem áudio em português: o jogo todo está em inglês, e como ele se baseia em conversas e decisões, é bom que o seu inglês esteja em dia para você não ficar boiando, pois os diálogos fluem rápido, e seu tempo de escolher uma resposta é curto.

Um final

[ATENÇÃO: A próxima seção do texto contém SPOILERS! Recomendamos ler apenas após completar o game!]

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Mesmo com todos os seus acertos, Oxenfree tropeça em algumas áreas bem importantes. A explicação por trás dos eventos e fantasmas faz completo sentido, só que muitos dos detalhes foram escondidos por trás de um objetivo adicional que aparece muito tarde no game. E os últimos minutos acabam passando tão rápido que muitos jogadores podem fazer escolhas apressadas sem entender exatamente o que estão escolhendo. Fica a impressão de que houve uma solução corrida e confusa para o mistério.

De fato, as escolhas são tratadas tão sutilmente que se torna impossível descobrir quando você fez uma escolha que vai mudar o futuro dos personagens ou não. Uma decisão em particular acabou modificando grande parte do meu final, e a explicação por trás dela veio muito depois.

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Por fim, apesar das implicações interessantes, o final desiste de uma conclusão satisfatória e descamba para uma reviravolta muito superficial que deixa um gosto ruim na boca — lembra um pouco o que rola nos filmes criados por M. Night Shyamalan. O final como um todo chega muito perto de perder o controle total da narrativa, o que é uma escorregada e tanto para um jogo que caminhava tão bem.

Uma conclusão

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Em suas pouco mais de quatro horas, Oxenfree cria personagens carismáticos e uma história complexa e muito bem desenvolvida sem abusar da “ilusão da escolha” tão presente em games do gênero nos últimos anos. O game é uma genuína evolução do gênero, homenageando os elementos que tornaram os games da LucasArts clássicos sem se prender a sistemas e ideias antiquadas.

Oxenfree pode não ser tão grande, épico ou atrativo para todos quanto um game da Telltale (o que provavelmente significa que ele não vai ser tão popular), mas o que ele consegue fazer é providenciar um pacote bem amarrado que vai encantar fãs de histórias contadas ao redor da fogueira durante uma noite de lua cheia. Vale mais pela jornada do que pelo final, mas ainda assim, vale pela experiência.

Oxenfree foi produzido e distribuído por Night School StudioO game foi lançado no dia 15 de janeiro para PC, MacXBox One e está disponível na Steam.

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