Análise Arkade: O pesadelo pode ficar mais interessante no mundo indie em Neverending Nightmares

22 de outubro de 2014

Análise Arkade: O pesadelo pode ficar mais interessante no mundo indie em Neverending Nightmares

O que você poderia fazer para expressar seus medos e preocupações? Para o desenvolvedor do indie Neverending Nightmares, sua depressão foi expressa em forma de jogo, o qual você pode conferir em nossa análise, é só continuar por aqui.

Neverending Nightmares é um projeto diferenciado, pois se trata do resultado emocional de seu desenvolvedor, Matt Gilgenbach, que apresentou seu jogo representando seus medos e temores enquanto passou por um período de depressão. Mas o que ele enfrentou sozinho consegue colocar medo em nós também?

A relação entre o desenvolvedor e seu projeto muitas vezes são distanciadas pela mídia tradicional e acabam fazendo com que aquele jogo seja um simples produto eletrônico e nada mais, ignorando as inspirações, ambições e motivos do desenvolvedor na sua criação. Claro que é difícil observar um jogo desta forma quando uma equipe de centenas de designers, escritores e programadores fazem parte do projeto, mas tudo muda quanto o jogo em questão é um jogo independente, já que o seu desenvolvedor acaba tendo mais liberdade e se sentindo mais à vontade para colocar suas experiências durante o desenvolvimento.

Neverending Nightmares expressa bem esse lado criativo independente, com seu pesadelo interminável experimentado por Matt Gilgenbach, o diretor do jogo que sofreu com depressão e Transtorno Obsessivo Compulsivo por muito tempo. Ele até melhorou após anos de terapia, porém o problema acabou retornando quando ele decidiu sair dos grandes estúdios para formar um estúdio independente

Seu primeiro jogo, Retro/Grade, tomou muito tempo de sua vida para ser produzido e mesmo com boas criticas e premiações de festivais segmentados, Retro/Grade trouxe fracasso financeiro para o seu estúdio, o 24 Caret Games. Seus problemas foram piorando e o que era para ter se tornado algo libertador rapidamente cresceu como um fruto de diversos pesadelos e alucinações providas pela depressão e seu TOC.

Análise Arkade: O pesadelo pode ficar mais interessante no mundo indie em Neverending Nightmares

Insistindo no mundo independente, Matt se deu mais uma chance e decidiu utilizar seus maiores medos como uma ferramenta de inspiração para o desenvolvimento de seu mais novo jogo, Neverending Nightmares. O projeto continuou firme e forte levando a sua proposta ao Kickstarter para quem se interessasse dar uma ajuda, pedindo US$ 99 mil,. O jogo conseguiu adquirir a sua quantia no último minuto. Sua proposta anunciada no site de “empurrões financeiros” prometia novidades para os jogos de terror, incluindo o conceito de pesadelos sem fim, onde um sonho te leva a outro te conduzindo a um estado de desespero em níveis profundos!

O game traz este desespero em diversas formas e com certeza é um dos maiores pontos que Neverending Nightmares ganha em comparação a qualquer jogo de terror e assim como o tenebroso P.T, você nunca sabe o que acontecerá no jogo, já que ele é imprevisível e conta com sua imprevisibilidade e aos impressionantes detalhes em cada cenário.

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Os detalhes aparecem no jogo como uma forma de desconforto. Com cores fortes contrastando com o restante do cenário preto-e-branco, palavras como “murder” ou tripas espalhadas pelos cenários mostram bem como o jogo faz de tudo para não te deixar se sentir bem ao jogo-lo. O senso de perigo é constante e você sempre joga com a sensação de que alguém quer te pegar e ao “acordar” deste pesadelo, um novo começa, o que é desesperador!

A história introduz Thomas, uma pessoa problemática que continua preso ao seu misterioso passado envolvendo a sua irmã, e entre muitos pesadelos, o jogo conta aos poucos sobre a psiquê do protagonista e o que ele realmente fez, com uma das primeiras cenas sendo Thomas dando facadas em sua irmã. A história continua com o protagonista acordando várias vezes de seu pesadelo e entrando cada vez mais na escuridão física de sua mente.

No jogo passamos por diversos cenários, desde os vários cômodos de uma antiga mansão, passando por cemitérios, até um hospício destruído pelos seus pacientes. Por ser um pesadelo que nunca acaba, Neverending Nightmares se aproveita disto e justifica as rápidas mudanças de cenário, já que em um sonho você nunca realmente sabe como chegou até naquele lugar e assim a transição de dois cenários completamente diferentes conseguem ter uma explicação plausível e ainda aumenta a tensão geral do jogo por você nunca saber aonde ele irá te colocar na próxima cena.

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Uma de suas maiores vantagens é o próprio ambiente de pesadelo que Thomas vive, pois nada é o que parece ser e os pequenos detalhes são percebidos pelo jogador, querendo ou não. Você anda em um corredor e sabe que algo está de errado, talvez sejam as pinturas na parede ou as bonecas com olhares frios que de tempos em tempos piscam para você; pode ser os estranhos passos que acompanham o movimento de Thomas ou os rabiscos estranhos nas paredes que formam cruzes de cabeça para baixo.

Mas o pior não é a ida e sim a volta, especialmente quando você vê que a boneca está em outro lugar, a pintura que tinham pés em cima de um banco agora está com o banco tombado no chão e os pés suspensos pelo ar e as cruzes desenhadas na parede estão com maiores detalhes.

Desta forma toda a tensão criada no seu primeiro caminho é intensificada porque a sua mente esta preparada para um susto desde o primeiro passo e até agora nada aconteceu, fazendo com que Neverending Nightmares seja imprevisível com seus sustos. Em jogos e filmes de terror você sabe que algo irá acontecer naquele momento, o inimigo irá aparecer do nada ou um objeto inofensivo cairá no chão e vai te assustar por causa de toda a tensão acumulada até aquele momento. A trilha sonora, que se torna mais estridente na hora do susto completa o pacote e coloca mais medo no ar. Particularmente não gosto deste estilo de terror porque o medo acumulado pela tensão do caminho é liberado por um susto barato que no final me deixa com raiva de ter ficado com medo daquilo do que aterrorizado de verdade.

Análise Arkade: O pesadelo pode ficar mais interessante no mundo indie em Neverending Nightmares

E por isso que acabei gostando tanto de Neverending Nightmares, o jogo te dá sustos sem utilizar elementos clichê do gênero, aqui não tem Jason aparecendo do nada nem cabeças caindo de armários. Seu terror é psicológico e errático, nunca sabendo quando veremos o inimigo te atacar e  você fica ainda mais perturbado pensando que é para acontecer algo mas até agora nada apareceu.

O estilo de terror psicológico que Neverending Nightmares traz se complementa com a sua jogabilidade, diferente dos outros jogos que tomam uma perspectiva de primeira ou em terceira pessoa, ele é um 2D sidescroller igual aos antigos beat’em ups. E por mais estranho que pareça, a tensão aumenta ainda mais pela forma que a câmera é imposta, tendo que mover o protagonista no ponto mais a frente possível para que a tela se mova, além de todos as pequenas mecânicas que foram implementadas na jogabilidade, como o seu minimalismo, ritmo do personagem ao andar e o próprio clima em cada cenário, que te deixa com atenção a todos os cantos da tela.

Outro jogo que seguiu a mesma mecânica de jogabilidade foi Lone Survivor (de Jasper Byrne), que também conseguiu utilizar o 2D como um aliado ao terror. Mas diferente de Lone Survivor, que utilizava gráficos 8-bits para deixar a sua mente imaginar o inimigo, Neverending Nightmares apresenta uma direção artística própria, inspirado pelos bizarros desenhos a base de tinta e caneta de Edward Gorey.

Análise Arkade: O pesadelo pode ficar mais interessante no mundo indie em Neverending Nightmares

Esta inspiração artística é dificilmente vista em videogames, com linhas grossas para os personagens e a ausência de cor na maioria do jogo, onde as cores estão somente aos itens que importam a Thomas e utilizáveis pelo jogador, enquanto o restante é tratado como rascunho.

No entanto, algo que me deixou incomodado é o número de boss fights que encontrei durante o jogo por parecer que eles foram inseridos com a intenção de aumentar a sua duração e dar algum desafio ao jogador. Sendo que muitas vezes a inteligência artificial do inimigo incomoda pelo quão responsiva ela é, pulando na sua cara para te matar com o minimo som feito com seus passos.

Por isso a imersão pode se perder durante a repetição do mesmo monstro te atacando e o que era para ser uma experiência única se torna cada vez mais mecânica. Porém, Neverending Nightmares se salva novamente pela estética de um pesadelo, enquanto o jogo faz de tudo para te colocar no clima, com controles simples, sem mapas nem tutoriais aparecendo na tela e quebrando qualquer tensão do jogo.

Neverending Nightmares consegue somar ao gênero com ideias novas, além de ser uma agradável resposta para os que insistem que terror é feito somente em primeira ou em terceira pessoa. E talvez um dos elementos mais aterrorizantes do jogo é que tudo ocorreu na vida real de uma pessoa com problemas mentais e transtornos depressivos, afinal o terror de verdade não é o sobrenatural e sim o que vivemos no dia a dia e dependendo da nossa saúde mental, pode acabar se transformando em pesadelos infindáveis que podem assustar mais do que qualquer monstro.

Neverending Nightmares está disponivel para PC, Mac e Linux, nas plataformas Steam e Ouya.

2 Respostas para “Análise Arkade: O pesadelo pode ficar mais interessante no mundo indie em Neverending Nightmares”

  • 23 de outubro de 2014 às 10:27 -

    Gui Mendes

  • Esse jogo parece incrível e aterrorizante, estou com sentimentos conflitantes por conta disso.

    Ao mesmo tempo que quero muito jogar, não quero chegar nem perto… Santa força do cagaço Batman.

  • 24 de agosto de 2015 às 18:56 -

    Marcio Roberto

  • Um game com um lance semelhante é o The Cat Lady, que aborda temas como suicídio, tristeza, vazio, solidão e principalmente depressão, tudo em meio a uma história fulminante com pegadas sobrenaturais e ainda assim sendo tão real…

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