Análise Arkade – Heavy Fire: Red Shadow atira pra algumas direções, mas acerta poucos alvos

3 de novembro de 2018

Análise Arkade - Heavy Fire: Red Shadow atira pra algumas direções, mas acerta poucos alvos

Em tempos onde o mercado independente está procurando encontrar novos (ou redescobrir antigos) nichos, alguns gêneros esquecidos tem ganhado importantes contribuições. Heavy Fire: Red Shadow pega uma carona nessa tendência, buscando criar uma mistura entre os chamados “jogos de tiro sobre trilhos” (que fizeram muito sucesso nas máquinas de shopping centers anos atrás, sobretudo com sucessos como Time Crisis e o ainda insuperável House of the Dead) e os jogos pautados em hordas de inimigos no melhor formato tower defense.

Se ambos os gêneros caíram no esquecimento das grandes desenvolvedoras, ainda que estejam presentes como mini-games ou missões específicas em obras mais amplas, aqui buscam encontrar um público descompromissado com enredo, estratégias elaboradas ou caminhos variados. É um jogo que, do começo ao fim, se pauta em “atire em tudo o que se mexer”. A questão é entender se essa simplicidade de Heavy Fire: Red Shadow funciona e sustenta o título.

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Uma história de guerra

Logo no começo do jogo, fica claro que o game irá se apropriar dos maiores estereótipos de obras baseadas em campos de batalha modernos. Sabe o narrador off com uma voz rouca naquele estilo Apocalypse Now? Tem. Sabe a explicação da missão usando mapas e vídeos do conflito como numa grande tela na sala de comando? Tem também. E aquele clima de “estávamos em desvantagem, não tínhamos como escapar e nossa única chance era lutar para sobreviver…”? Tudo lá, como em um grande tratado que brinca de se levar a sério.

O principal inimigo aqui é uma versão alternativa da Coréia do Norte. Com uma narrativa que não sabe se procura a sátira ou um tom de crítica política, há ali a caracterização maniqueísta do bem contra o mal, do nós contra eles, do mundo sem escalas de cinza. Nas primeiras duas ou três missões, as cenas convencionais de explicação do contexto estão lá para cumprir um papel, mas basta alguns segundos para que o jogador só queira logo pular a explicação enfadonha.

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Como um todo, a narrativa tem lá a sua função no jogo, buscando contextualizar o tiroteio desenfreado. Se esforça em manter o jogador no clima de combate intenso e de perigo constante, e essa tentativa de criar uma tensão típica de conflitos (e de produções audiovisuais sobre a guerra, como um todo) é admirável. Contudo, a execução é um tanto quanto preguiçosa e a ironia acaba ficando por ela mesma, não avançando, não evoluindo. Explorar o clichê não é necessariamente um problema em si. Se limitar a ele, sim.

Em cima da torreta

Quando toda a ambientação termina, chega a hora da verdade: estamos diante de um jogo de ação de tiro em primeira pessoa, onde o jogador é colocado na posição de atirador em uma metralhadora fixa com rotação de 360 graus com a missão clara e objetiva de aniquilar as hordas de inimigos que se aproximarem em um sistema de ondas, tal como já é tradicional de jogos no citado formato tower defense.

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Não demora para que os inimigos surjam. São soldados comuns com metralhadoras ou com lançadores de mísseis, homens-bomba (não sei aqui se o termo kamikaze se aplica, uma vez que não são japoneses, mas a ideia é basicamente a mesma: se explodir para acabar com inimigo), veículos terrestres – caminhões e jipes militares, por exemplo, transportes que chegam por água para descarregar tropas… enfim, alguns dos arquétipos do gênero.

Ainda assim, a variedade de inimigos acaba sendo uma decepção ao final do jogo. Pouco ou nada é acrescentado ao longo da campanha. Os mesmos inimigos que você encontra na primeira missão estarão na última, com a única diferença sendo a quantidade deles. Esperei que logo surgissem outros desafios, como tanques de guerra, veículos aéreos, outros tipos de infantaria, mas nada acontece. Tudo se mantem. A dificuldade equilibrada de Reavy Fire: Red Shadow se dá única e exclusivamente pelo volume de inimigos em cada onda e pela direção de onde eles vem.

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Os cenários, por outro lado, estão dentre os acertos do game. Ainda que simplificados, são dotados de muitas construções destrutíveis, permitindo que, ao longo da jornada, o ambiente relativamente pacato se torne, de fato, um campo de batalha. Paredes caem com tiros massivos, veículos explodem, árvores e outros objetos cênicos são afetados pelo tiroteio… enfim, há aqui a sensação de que, de fato, não são só os inimigos que sofrem dano.

Outra característica que começa bem e acaba se tornando repetitivo é o próprio sistema de combate. O jogador conta com uma metralhadora e um lança-mísseis no começo do jogo. Já no final… também. O arsenal se mantém inalterado do começo ao fim, com a possibilidade de ser melhorado com alguns upgrades que vão sendo acionados pelo jogador conforme ele avança no game. São adições úteis em termos de sobrevivência no jogo (como não precisar recarregar a arma principal ou o aumento de dano dos mísseis), mas que não trazem variedade em termos de gameplay.

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Além de poder atirar ao longo das 4 ou 5 horas da campanha (dependendo da capacidade do jogador em seguir adiante), há alguns sistemas de assistência que podem ser convocados com o toque de um botão. Soldados extras, bombardeios aéreos, itens de recuperação de energia… enfim, dá pra pedir socorro algumas vezes quando a situação fica mais difícil. É um fator interessante, que traz um frescor ao ambiente, mas é um elemento externo, algo para além da experiência do jogador em si. Ameniza, mas não resolve a repetição.

No fim, o game se apoia em uma única ideia: colocar o jogador em cima de uma torreta e soltar o clássico “atire a vontade”. É divertido, funciona, mas cansa. A narrativa não ajuda, a falta de diversidade de inimigos e de arsenal é evidente e as poucas fases do jogo, divididas em 4 estágios com 3 ondas cada, parecem intermináveis. A campanha, nesse sentido, é curta, uma vez que são meia dúzia de fases onde nada muito significativo acontece, e ao mesmo tempo é arrastada, já que é repetitiva ao extremo.

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Só para comparação, eu adoro as cenas de Uncharted ou de Dino Crisis 2, por exemplo, onde há o clássico momento de usar uma metralhadora enquanto se foge de jipe e os inimigos vão aparecendo, correndo atrás do jogador. São momentos de adrenalina, de quebra, se dinamismo. Agora, imagine se esses games colocassem o jogador para ficarem por 4 horas nessas fases, com os mesmos inimigos surgindo. É mais ou menos essa a sensação de Heavy Fire: Red Shadow. Uma boa ideia simples executada de forma enfadonha.

Uma guerra sem brilho

Quando pensamos nas produções mais recentes que abordam o campo de batalha, como as séries já tradicionais Call of Duty e Battlefield, temos uma visão mal acostumada da capacidade de reconstrução estética da guerra. Da textura de figurinos à reprodução fidedigna de armas e equipamentos bélicos, tudo demonstra um trabalho de pesquisa histórica extraordinário. E não são só as grandes produções que podem se dar a esse luxo. Valiant Hearts é um ótimo exemplo de como se pode representar o gênero mesmo dentro de um menor escopo de modo competente.

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Infelizmente, Heavy Fire: Red Shadow carece desta qualidade audiovisual a qual estamos habituados. Há uma óbvia limitação: é um jogo estruturado no combate a distância, uma vez que o jogador não avança na direção do adversário e precisa eliminá-los massivamente. Ou seja, não é esperado que se veja os inimigos de perto, por exemplo. No máximo, um maluco-bomba correndo em direção ao olhar, no susto. Então, não se espera mesmo uma fidelidade gráfica em torno das figuras humanas.

A questão é que todo o entorno poderia ser um pouco mais trabalhado. O ponto de vista, apesar de girar 360 graus, é fixo, o que facilitaria muito a construção do ambiente por meio de modelos, texturas e iluminação. E. nesse sentido, o jogo parece uma produção da geração anterior. Longe de ser feio, claro, mas mesmo sendo uma game de baixo orçamento, peca muito em uma composição artística básica e sem qualquer destaque. Há um ou outro cenário mais elaborado, como o trecho final, mas ainda assim, é burocrático.

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Objetos destrutíveis, como citado anteriormente, que se acumulam ao longo da fase colaboram para esse cenário e agregam valor. Seria muito interessante que os inimigos vencidos permanecessem caídos no campo. Mas em termos gerais, o jogo é feito sem muitos detalhes, pra ser visto de longe. O clima é adequado – até porque o jogo força que os poucos cenários funcionem de dia e de noite. Elementos específicos, como o helicóptero de suporte, ou os efeitos de iluminação noturna valorizam o trabalho, mas na média, o quesito visual é apenas ok.

Já em termos sonoros, há uma escolha que pareceu muito coerente: a trilha musical é muito pouco presente, é sutil, com aquela tensão dos filmes de guerra dos anos 1980/1990. A batalha, em sua completude, é crua, valorizando a sonoplastia de tiros e explosões. Claro que, pela já citada limitação no arsenal do protagonista, aquele som de metralhadora acaba dominando a experiência como um todo, mas funciona enquanto atmosfera.

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Como um todo, é um jogo que responde ao que se espera no que tange o audiovisual, mas passa longe de ser marcante ou, ao menos, apresentar algo que lhe confira identidade. Consegue estabelecer o clima bélico a partir de clichês em todos os aspectos, sobretudo na sua ambientação e na criação artística, com uma dublagem muito arquetípica e efeitos sonoros bem articulados, e se destaca mesmo na trilha musical, que consegue quase que se camuflar enquanto ambiência.

Conclusão

Heavy Fire: Red Shadow cumpre o que promete, mas promete pouco. É um jogo que funcionaria muito bem em uma cabine no saguão do shopping, e sua funcionalidade VR caberia muito bem como uma ação de 15, 20 minutos. Enquanto jogo completo, porém, entrega uma experiência que começa lenta e, quando embala, já enjoou. Tem méritos, funcionando muito bem como um passatempo descompromissado e sem qualquer pretensão maior com gameplay, narrativa ou experiência audiovisual.

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Fica a ressalva, porém, que o jogo não foi avaliado usando os recursos da realidade virtual. Jogamos da forma tradicional, na TV e, neste caso, essa percepção pode não ser a mesma se utilizado o equipamento. Ainda assim, há muito espaço para melhoras na proposta do jogo, que ainda sofre com alguns bugs ocasionais que podem atrapalhar o ritmo e até levar consigo a pouca paciência do jogador.

Disponível para Playstation 4 (e PSVR), XBox One e PCHeavy Fire: Red Shadow está disponível com áudio e texto no idioma original, o inglês.

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