Análise Arkade: O macabro e bizarro, porém problemático manicômio de Lithium: Inmate 39

29 de outubro de 2016

Análise Arkade: O macabro e bizarro, porém problemático manicômio de Lithium: Inmate 39

O Halloween já está muito próximo, e entrando antecipadamente no clima de terror da data, é hora de conferir o bizarro game da produtora costa-riquenha Canu Arts, um misto de puzzle com terror e muitas cenas grotescas e bizarras em um ambiente completamente opressor e assassino. Confira agora nossa análise de Lithium: Inmate 39.

O inferno da mente, e a dor do mundo real

Análise Arkade: O macabro e bizarro, porém problemático manicômio de Lithium: Inmate 39

Lithium é um puzzle game baseado em sua peculiar narrativa com uma história de dor e sofrimento. Nós controlamos uma estranha criatura pequena, de olhos gigantes amarelos e uma aparência grotesca e deformada, que não sabemos nada, além de que é chamada de interno 39. A criatura, abandonada sozinha em um escuro leito de manicômio acorda com um terrível barulho do lado de fora de sua porta, e aquela é a gota final, a criatura quer fugir daquele lugar terrível que não abriga nada além de morte.

E o caminho da criatura é narrado pela voz de um homem, um paciente, que em seus momentos de lucidez escreve sobre sua vida, para que ele não se esqueça de quem é, e relembre de seus fragmentos de memória quando dominado pela loucura que o trancafiou em um hospital psiquiátrico. A questão no entanto é, essa criatura e o mundo a sua volta são fruto da mente distorcida desse homem, ou ele realmente é aquela criatura, olhando para si mesmo com outros olhos observadores?

Análise Arkade: O macabro e bizarro, porém problemático manicômio de Lithium: Inmate 39

O game progride com a voz nos contando mais sobre si mesmo conforme avançamos, pois tudo o que a própria voz quer é entender tudo o que nós, jogadores, estamos vendo. E assim nós acompanhamos essa desgraçada e covarde criatura buscando uma saída daquilo tudo, uma saída do lugar escuro e morto onde está, e acima de tudo, com a pergunta que é posta implicitamente no início: do que exatamente essa criatura quer escapar?

A voz e os outros pacientes

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A narrativa então segue desa forma fragmentada. Ao início de cada fase do game, a voz nos conta mais sobre ela, e sobre o que ela consegue entender sobre aquele mundo, pois a medida que avançamos, nós, e a própria voz desvendam um pouco mais sobre aquele lugar. A narrativa então se torna mais “conceitual” do que objetiva, ela é uma reflexão da mente quebrada de uma pessoa que sofre com sérios transtornos psicológicos, e além disso, da mente de outras pessoas com seus traumas e transtornos.

Ao longo do caminho, nos deparamos com monstros disformes, nojentos, em sua inércia nesse mundo, até que a criatura se aproxima e elas a caçam sem qualquer piedade. Criaturas feitas de braços decepados e costurados, ratos cheios de olhos e partes de bebês, jacarés com dentes por todo o corpo, inclusive nas costas. E acima de tudo, os outros pacientes.

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Ao final de cada fase do game temos as boss battles, onde temos que enfrentar os transtornos de outros pacientes, os outros internos do manicômio, como uma manifestação física de suas demências. Antes de enfrentar cada um deles encontramos suas fichas médicas no cenário, que contam suas histórias, avaliações de seus problemas e procedimento médico submetido a eles, onde notamos uma coisa em comum para todos: Lítio, o elemento químico que dá nome ao game, que também é usado como medicação contra diferentes distúrbios mentais, como bipolaridade, esquizofrenia e até mesmo depressão profunda.

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E os visuais de cada inimigo são reflexos do que lemos nessas fichas, como por exemplo o segundo chefão, descrito como um homem que sofria de depressão profunda e tentou cometer suicídio se enforcando, mas falhou. E que, após sua internação, tentou cometer suicídio novamente mutilando seu estômago com uma faca de cozinha, falhando novamente. O visual desse inimigo é terrível, um homem ensanguentado com o pescoço quebrado e a cabeça pendurada para trás, a barriga mutilada formando uma enorme boca com dois olhos vermelhos acima.

O covarde e o assassino

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Para enfrentar todos esses terrores, o interno 39 tem a sua disposição apenas uma lanterna a óleo, pois o game é incrivelmente escuro, e a lanterna literalmente salva a vida do jogador revelando armadilhas. E um outro aliado da criatura é um terrível monstro assassino. Ao se girar uma chave de corda em antigos relógios de pêndulo, um monstro é libertado, uma criatura humanoide sem pele, feita de pura raiva.

Ao chamar essa criatura, temos controle sobre ela por um curto período de tempo, que pode ser aumentado ao se coletar corações, se houver algum por perto. Essa criatura é forte, e a utilizamos quando precisamos atacar, matando inimigos que a criatura pequena não pode encarar e quebrando obstáculos. E quando o tempo acaba, o monstro retorna para o relógio, e a pequena criatura, que se encolhe de medo quando o monstro aparece, volta a ser controlável.

Jogabilidade

A jogabilidade de Lithium: Inmate 39 é bastante simples. Quando controlados a pequena criatura o game possui um formato de câmeras fixas, bem ao estilo Silent Hill, com câmeras fixas em alguns pontos nos seguindo enquanto nos movemos. Podemos mover um pouco a câmera nesses pontos para observar adiante e ver se há alguma armadilha por perto. E quando controlamos o monstro, a câmera passa a seguir o personagem pelas costas, e podemos girar a câmera sobre ele.

Ambas as criaturas possuem poucos comandos, a pequena pode ligar e desligar sua lanterna, pular, correr e se agachar, além de realizar um movimento de pegar objetos com a mão, que é inútil, pois para pegar qualquer objeto basta se aproximar dele que o personagem os pega automaticamente. O monstro pode correr e atacar usando as mãos, ou usando um facão ou um revólver, se houver algum próximo para ser coletado.

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A jogabilidade da criatura pequena é simples e funcional, mas problemática. A mudança de ângulos de câmera muitas vezes prejudica o gameplay. Por exemplo, se você está andando para a esquerda e a câmera muda, continuando a segurar para a esquerda o personagem continua a andar na mesma direção, até que os ângulos são corrigidos e a criatura se confunde toda nas direções. Muitas vezes ficando presa andando sozinha na mesma direção sem podermos parar ela. Os pulos da criatura são bem complicados. A criatura não pula alto nem longe, e muitas vezes armadilhas que devemos passar pulando nos matam por questão de milímetros.

A criatura grande no entanto tem uma jogabilidade mal construída. Por algum motivo, os controles da câmera são invertidos, se você quer olhar pra esquerda, gire a câmera pra direita, e vice versa. Atacar não é exatamente efetivo, felizmente a criatura não pode ser morta, e mesmo atacando a esmo matará os inimigos, e mirar com o revólver é uma tarefa terrível. A mira não se move de forma satisfatória, e o jogador perde segundos preciosos do tempo que tem para controlar a criatura apenas para mirar nos inimigos.

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E um problema bem ruim está ao se usar o monstro. Em certos pontos do game temos somente 15 segundos de controle sobre ele. Geralmente em trechos com apenas um único inimigo ou onde devemos destruir um obstáculo. Mas se por qualquer motivo os 15 segundos acabarem antes de realizar esses atos, já era, o jogador deverá resetar o game e reiniciar seu checkpoint para isso. Isso acontece pois, para usar o relógio, devemos primeiro achar a chave de corda, e uma vez coletada essa chave, ela não reaparece se precisarmos novamente. Então, acabou o tempo do monstro? Reinicie o game. Infelizmente isso é apenas um dos muitos problemas que o game tem…

O pesadelo dos bugs…

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Infelizmente o game é recheado de bugs em toda a sua extensão. Bugs que realmente estragam a experiência de uma forma muito desagradável… Como já mencionado, existe o problema da troca de ângulo de câmera. Este, podemos até relevar, pois até hoje muitos games com esses estilo de câmera também sofrem disso, infelizmente esse estilo de câmera ainda não está 100% livre desse problema, mesmo hoje em 2016.

Porém, muitas vezes a mudança de câmera atrapalha muitas outras coisas. Congela armadilhas, muda a câmera em ângulos errados, ou as vezes a câmera não muda e perdemos a visão do personagem… Outros problemas estão ainda na interação com puzzles, muitos funcionam de forma errada, outros por razões de bugs nem mesmo funcionam. E os bugs podem até mesmo afetar os bosses!

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Eu venci dois bosses no game graças a bugs! Um desses bosses deve ser morto afogado, e muito antes de chegar nele, tomei um grande susto com uma cena estranha que pulou na tela com um grito, e vi a animação de morte desse boss. E quando cheguei até a área onde o enfrentaria, o boss não estava lá. Já estava morto antes de eu chegar! O outro, confesso que foi proposital. Usei o bug das câmeras para congelar armadilhas, forcei o boss a atravessar um obstáculo e se afastar de mim, e depois corri até o ponto onde eu deveria ativar uma armadilha para matá-lo. Mas nesse ponto, eu morri. O problema foi, na hora do respawn, o boss continuava naquele lugar, e automaticamente morria! E quando eu ia até o lugar onde o boss estaria inicialmente, a animação de apresentação dele acontece, mas ele não estava mais lá!

Todos esses bugs tornam a experiência do game muito frustrante, o que é uma pena, pois é um game que realmente tem muito potencial, com puzzles simples, mas engenhosos para entreter os jogadores. E a combinação do gameplay inconstante com esses bugs causa dezenas de mortes que seriam facilmente evitadas.

Audiovisual

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Por outro lado, uma coisa que o game manda bem é na sua parte audiovisual. Lithium: Inmate 39 possui gráficos simples, sem muito polimento quando vistos de perto, mas a atmosfera que o game cria é excelente. O game todo está em preto e branco, exceto algumas cores que podemos ver, o amarelo dos olhos da criatura e o vermelho de sangue.

Os cenários do game são tenebrosos, com a noite fechada que abriga os corredores escuros e decrépitos de um manicômio infernal, cheio de partes de corpos espalhadas por todos os lados, entulho e sujeira. O contraste da luz branca e do escuro cria cenas visualmente impressionantes, com partes estrategicamente desfocadas, sombras e esquinas macabras.

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Além dos onipresentes manequins e máscaras, espalhados por todos os cenários do game em poses e formas perturbadoras. Muitas vezes nos apontando caminhos, outras formando cenas macabras. A própria presença desses objetos no game contribuem ainda mais para o mistério todo de seu enredo, e tornam o próprio fator terror do game ainda mais desagradável, dessa vez no bom sentido.

A parte sonora do game é igualmente opressora, e se teve algo que a Canu Arts mandou bem foi na concepção dessa atmosfera através de seus cenários combinado com seus sons. Temos músicas típicas de filmes de terror, com rangidos, “estouros” em momentos certos, e aqueles sons que normalmente ouvimos em cenas de terror com lugares desolados que abriam perigos invisíveis, que aparecem quando menos esperamos.

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O game infelizmente manda mal em sua parte técnica, mas na sua parte artística consegue mandar incrivelmente bem, mesmo com os gráficos extremamente simples, conseguindo usar tanto o escuro como a claridade para criar uma forte identidade visual para o game, que certamente conseguirá causar desconforto e até causar um pouco de medo e sustos nos jogadores.

Conclusão

Análise Arkade: O macabro e bizarro, porém problemático manicômio de Lithium: Inmate 39

Infelizmente Lithium: Inmate 39 sofre de erros terríveis que comprometem e muito a experiência final. O game tem sim muito potencial, sua atmosfera é intensa, podemos sentir o clima que é transmitido pelos ângulos de câmera, o preto e o branco e os sons macabros. O enredo do game é bem interessante, apesar de deixar uma sensação de que tudo acaba abruptamente e sem uma conclusão, mas que ainda assim é interessante, abordando os transtornos mentais do protagonista e seus inimigos de maneira tão sombria e grotesca.

Mas a quantidade de bugs e problemas de gameplay do game tornam a experiência muito mal aproveitada no fim das contas. Realmente uma pena, pois esse era um game que talvez se tivesse levado mais tempo para ser lançado, e principalmente se não possuísse a obscenidade de bugs e erros que possui, certamente seria um game que atrairia muito mais jogadores.

Lithium: Inmate 39 foi lançado no dia 25 de outubro, com versões para PC PS4.

Uma resposta para “Análise Arkade: O macabro e bizarro, porém problemático manicômio de Lithium: Inmate 39”

  • 31 de outubro de 2016 às 15:23 -

    Luan Henrique Gomes de Almeida

  • Muito boa análise.

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