Análise Arkade: O fim de The Walking Dead (Season 4 Ep. 2) “Vinde as Criancinhas”

28 de setembro de 2018

Análise Arkade: O fim de The Walking Dead (Season 4 Ep. 2) “Vinde as Criancinhas”

A Telltale Games lançou o segundo episódio da temporada final do game baseado na franquia The Walking Dead, intitulado como “Vinde as Criancinhas”. Já jogamos o episódio e vamos contar como está se desenvolvendo a última história de Clementine, mas devido aos acontecimentos envolvendo a Telltale vou me permitir divagar um pouco sobre o assunto na parte final dessa publicação.

Os últimos dias foram turbulentos para a empresa e, especialmente, para seus funcionários que foram demitidos em massa sem aviso prévio. É deveras estranho jogar o capítulo dois sendo que, provavelmente, é o conteúdo final do game. Vale destacar que é um conteúdo muito bom, mesmo com algumas ressalvas. Na análise do episódio um, “Chega de Fugir”, falei sobre o âmbito geral do jogo, suas novidades e otimizações. Sendo assim, essa crítica tem foco maior na narrativa visto que não há nenhuma novidade mecânica em relação ao capítulo passado.

Você pode ler a análise do episódio um aqui. Lembrando que o texto contém alguns spoilers, então leia por sua conta e risco e saiba que essas informações podem prejudicar sua experiência. Porém, como nossas decisões mudam as árvores de diálogo do jogo é possível que sua jornada seja diferente.

Diálogos consistentes, Problemas recorrentes

Para situar o leitor que por ventura não tenha jogado o episódio um, “Chega de Fugir”, segue um breve resumo: Clementine e AJ estão na estrada lutando por sua sobrevivência como de costume. Em determinado momento encontram uma nova comunidade situada em uma escola e composta apenas por adolescentes que eram alunos da instituição. Alguns jovens haviam desaparecido algum tempo atrás e no fim revela-se que Marlon, líder da comunidade, os entregou para um grupo externo com propósitos misteriosos.

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AJ é a figura central desse episódio

Depois de alguns eventos conflitantes Marlon tenta acusar Clem de um assassinato que ele cometeu e, em função disso, ela o desmarcara e faz com que todos lá saibam da verdadeira índole de seu líder. Há nuances nos personagens, apesar de The Walking Dead, especialmente nos jogos, sempre usar do maniqueísmo de forma acentuada. Tudo isso culmina em AJ atirando a queima roupa em Marlon após ele estar desarmado e rendido e esse fato é o estopim do episódio dois.

Esse capítulo fala sobre perdão, redenção, bondade e maldade, tudo transmitido para o jogador por meio da figura de AJ. O garoto é fruto de um mundo sem leis e tudo que ele sabe advém da necessidade de sobreviver e, por essa razão, suas ações e pensamentos são mais literais do que deveriam ser em um contexto normal. AJ enxerga seu ato com certa naturalidade, afinal, Clementine sempre o ensinou a atirar em monstros e ter cuidado com pessoas perigosas. Marlon era perigoso, logo, deveria ser contido.

Se ele era mal e deveria ser contido por que as pessoas repreenderam sua ação? É esse tipo de questionamento que AJ coloca sutilmente na mesa, sem entender a gravidade de sua ação. Além dos questionamentos morais de AJ, o episódio aborda como as pessoas a sua volta reagem diante da situação.

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“Matar nunca é fácil, nem divertido, muito menos… trivial” – Clementine

As pessoas o chamam de assassino e essa nomenclatura é atribuída a pessoas ruins, logo, ele é ruim e provavelmente vai morrer também.  Esses paralelos são traçados sempre pelo garoto e cabe ao jogador contextualizar a situação e explicar que matar uma pessoa é diferente de ser um assassino. Explicar o contexto faz toda a diferença para contrastar com a visão linear do garoto.

É interessante o que o episódio faz em termos de montagem, pois nos momentos iniciais é realizado um jogo de cortes rápidos, mantendo a perspectiva da câmera, mostrando Clem e AJ no momento em que o garoto assassina Marlon e posteriormente na manhã seguinte com essas ponderações de Clementine. Esse jogo de perspectiva é inédito na série e funciona muito bem.

Análise Arkade: O fim de The Walking Dead (Season 4 Ep. 2) “Vinde as Criancinhas”

Para variar algo ruim acontece com os protagonistas

Outro aspecto que agora foi explorado é a relação amorosa de Clem com outros personagens. Não vou falar com quais personagens ela pode ter um “relacionamento”, mas é interessante que a Telltale nos permite escolher com qual gênero vamos nos relacionar.

É agradável acompanhar esse aspecto da vida de Clem, mas a construção desse momento não é bem estruturada, pois não parece algo natural. Os novos personagens são minimamente interessantes, mas não há tempo para estabelecer nenhum grande vínculo que torne esse momento algo especial. Em contraponto, também há beleza em tornar cotidiano e não poético o “relacionamento” de dois adolescentes. E esses momentos de calmaria são os mais interessantes, pois é ali que se desenvolve conversas triviais, filosóficas e nostálgicas que dão um tempero a mais na narrativa.

Os fãs dos quadrinhos vão gostar de saber que os Sussurradores, grupo icônico da franquia, é introduzido nesse episódio e se a história continuar provavelmente vão aparecer novamente. Os aspectos negativos desse capítulo não são novidade e já falei sobre eles na análise passada.

Análise Arkade: O fim de The Walking Dead (Season 4 Ep. 2) “Vinde as Criancinhas”

Sussurradores: fan service necessário?

Os pontos de virada baseiam-se sempre em qual personagem vamos salvar e, consequentemente, qual ira morrer em função de nossa escolha. Além disso pela incapacidade de criar novos personagens importantes os escritores do jogo optam por sempre trazer de volta algum personagem de temporadas passadas, como se fosse plausível tais encontros.

Sim, é um videogame e a suspensão de descrença é necessária, mas sempre que há um ponto de conflito no roteiro ele surge em função de um personagem que sumiu, reapareceu e agora é mal. É meio pobre esse tipo de decisão e mostra como o universo de The Walking Dead está sofrendo por falta de inovação.

Conclusão

Se o jogo de The Walking Dead acabar nesse episódio vai ficar um gosto amargo em nossa boca porque não há um final. O capítulo termina em um gancho que indica um grande combate contra o “grupo do mal”. Novamente um combate contra um “grupo do mal”. Gosto de ver que tons de cinza existem nessa série de jogos, mesmo que o maniqueísmo prevaleça e os conflitos sejam sempre reciclados.

“Vinde as Criancinhas” é superior ao primeiro episódio e vale a pena ser jogado por seu texto bem escrito. Espero que em breve eu possa voltar com minhas divagações sobre o episódio três, mas se isso não acontecer desde já agradeço a Telltale por seus serviços prestados.

O segundo episódio da temporada final de The Walking Dead, “Vinde as Criancinhas” foi lançado em 25 de setembro para PC, PlayStation 4 e Xbox One.

Sobre a Telltale Games

Muitas informações sobre o “destino final” da Telltale estão sendo divulgadas diariamente, mas já sabemos de alguns fatos concretos. A empresa demitiu cerca de 90% de seus funcionários, mantendo apenas algumas pessoas que vão finalizar trabalhos que já estão oficializados em contrato e os jogos anunciados ou em pré-produção foram oficialmente cancelados. As notícias acerca da temporada final de The Walking Dead dizem que o episódio dois é o último que será lançado, apesar da Telltale já ter se manifestado publicamente ventilando a possibilidade de encontrar parceiros comerciais para ter condições de finalizar os episódios três e quatro.

Na data que estou redigindo esse texto a Telltale retirou do ar a Final Season impossibilitando novas compras do produto, ou seja, um possível indício que o jogo oficialmente acabou. Se não for o caso, ao menos o projeto está em pausa até que encontrem uma solução viável para o problema. Quando a Telltale anunciou sua falência a reação de todos, inclusive a minha, foi de tristeza.  Inicialmente porque vindouros jogos não seriam mais desenvolvidos, mas especialmente porque a empresa é muito importante no cenário mundial de games, independentemente se você gosta dos títulos ou não. A Telltale tornou o gênero point and click/adventure popular novamente, mesmo que rapidamente tenha abandonado esse estilo focando muito mais em narrativas e tornando seus produtos quase visual novels com leves elementos de jogabilidade.

A primeira temporada de The Walking Dead está sedimentada como uma das melhores coisas que os videogames já produziram e isso é legado da Telltale, mesmo que os games subsequentes tenham perdido qualidade. A empresa saturou o próprio gênero que ela popularizou com muitos títulos por ano, escolhendo propriedades intelectuais famosas, mas que não refletiram em vendas. Os passos foram maiores que suas pernas.

Também há relatos de jornadas extensas de trabalho, fato relativamente comum em empresas de games, que desgastam física e psicologicamente os empregados e são ações prejudiciais para qualquer empresa. E a justificativa da falência é financeira, já que nenhum game deu tanto lucro como a primeira temporada de The Walking Dead. Mas o mais importante nesse momento é que os funcionários recebam o que lhes é devido e que possam ser realocados rapidamente em outras empresas. No âmbito geral esse é o cenário que cerca a Telltale Games e se mais informações relevantes surgirem a Arkade noticiará.

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